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FST: Boaventura vê capitalismo e suas sete ameaças

 

Sociólogo afirma, em Porto Alegre, que só é possível enfrentar crise ambiental atacando também desigualdade e declínio da democracia

Por: Antonio Martins

Fonte: Outras Palavras

“Por cinco séculos, a Europa procurou ensinar ao mundo sua forma de enfrentar as crises e vencê-las. Fez isso com ideias e guerras, com missionários e genocídios. Mas se esqueceu que detinha apenas uma parte do conhecimento. Fechada em si mesma, não pode mais aprender. Por isso, está à beira de um abismo, do qual dificilmente escapará.

No meio da manhã desta quarta-feira (25/4), o sociólogo português Boaventura Sousa Santos está abrindo uma conferência para cerca de trezentas pessoas, que participam do Fórum Social Temático (FST), em Porto Alegre (sul do Brasil) e municípios de sua região metropolitana. O FST é um desdobramento, em pequena escala, dos Fóruns Sociais Mundiais (FSMs), lançados na mesma capital em 2001. Debate um assunto específico (“Crise capitalista, justiça social e ambiental”). Reúne cerca de 10 mil pessoas. Mas mantém, como todas as edições do FSM, a mesma aposta num futuro de democracia radical, relações sociais baseadas na garantia dos direitos humanos e fim das hierarquias internacionais que dividem o planeta entre “centro” e “periferia”.

Outra cidade brasileira, o Rio de Janeiro, sediará, em junho, a conferência Rio+20, da ONU. Por isso, a crise ambiental é um tema-chave em Porto Alegre. Boaventura discorda da abordagem que se dá tradicionalmente a ela. “Um primeiro problema primeiro é a disputa pela definição da natureza da crise”, diz ele. “Vê-la como mera mudança climática é muito reducionista. A crise é econômica, financeira, energética, ambiental, civilizacional”. O sociólogo chega, então, ao primeiro ponto central de sua análise. “Como disse Marx, as microirracionalidades do capitalismo conduziam à marcroirracionalidade da vida”.

Nos próximos 50 minutos, a fala densa de Boaventura tentará destrinchar as “sete ameaças” em que se desdobra esta marcoirracionalidade. Na plateia, dezenas de pessoas registram seus argumentos em cadernos, fotografam a sociólogo com câmeras ou celulares ou simplesmente acompanham a exposição de suas ideias.

Das ameaças elencadas por este professor das universidades de Coimbra (Portugal) e Madison (Estados Unidos), quatro estão diretamente relacionadas à crise da democracia; as outras três, à desigualdade e, em particular, ao poder que as grandes corporações alcançaram para contornar os poderes tradicionais e se apropriar da riqueza coletiva por meio de mecanismos sobre os quais as sociedades não conseguem ainda incidir.

A primeira ameaça é, para Boaventura, a desorganização do Estado. “O capitalismo, em sua forma atual, já não precisa da democracia”, diz ele. Por isso, dois países da Europa (Itália e Grécia), além do Banco Central Europeu, são governados por “vice-reis”, antigos executivos do banco de investimentos Goldman Sachs. E os Estados, que durante séculos basearam seu poder na arrecadação de impostos, agora eliminam tributos e se orgulham de manter suas funções apoiando-se nos mercados financeiros.

“Mas as dívidas que eles fazem precisam ser pagas um dia, e os cidadãos estão sendo chamados a contribuir pesadamente para este pagamento”, pensa o sociólogo. O pior, no caso europeu, é um desenvolvimento particular da “síndrome de Estocolmo”, fenômeno que leva as vítimas de um sequestro a se identificarem com seus algozes. “Para vocês, na América Latina, o que estamos vivendo é um déjà vu. Para sair da crise, América Latina, Ásia e África, aprenderam a desobedecer. A Europa não quer fazê-lo porque sempre se viu como parte dos que comandam…”.

Em paralelo à desorganização do Estado, caminha a desconstrução da democracia, segunda identificada por Boaventura. “O regime democrático costumava ser mais que o direito elementar de depositar um voto numa urna. Significava ter acesso a saúde, educação, bem-estar. Esta parte da democracia foi sequestrada pelo neoliberalismo. E já nem precisam de ditaduras, porque a própria democracia tornou-se uma ditadura, neste aspectos. Está emergindo um totalitarismo gradual, diferente do fascismo. Os direitos mais elementares são cortados. As sociedades conservam-se formalmente democráticas, mas socialmente fascistas”.

Os dois outros riscos relacionados com o sistema político são criminalização da dissidênciae a recolonização da diferença. Para abordá-los, Boaventura refere-se a um caso conhecido dos que o escutam. A cerca de mil quilômetros de Porto Alegre, o Brasil viveu, neste domingo (22/1), um ataque brutal do Estado a um direito social. Dois mil soldados da Polícia Militar desalojaram, em nome do direito à propriedade, 6 mil pessoas que haviam ocupado e transformado em bairro, o Pinheirinho – uma área abandonada, pertencente a um grande especulador nos mercados financeiros.

“O que ocorreu no Pinheirinho”, diz o sociólogo, “é uma pequena mostra do que se passa num continente onde os mapuches chilenos são aprisionados por resistirem ao desmatamento e às mineradoras, onde os indígenas são mortos no Peru quando querem defender suas terras das transnacionais que cobiçam o subsolo”. Ele prossegue: “Além de criminalizar os dissidentes, o sistema que reenquadrar os diferentes. Ao contrário do que podíamos pensar, racismo está de volta e com força. Não há sinal de que sexismo tenha terminado, nem de que as diferenças sexuais sejam respeitadas”. Estas manifestações são resquícios da dominação colonial, que agora derivou em preconceito”.

Para Boaventura, este reaprisionamento do Estado e ataque à democracia está relacionado com três movimentos do capital para apropriar-se da riqueza produzida coletivamente. O primeiro é a devastação acelerada da natureza, tema da Rio+20. “Ela é real é importantíssima, mas não existe sozinha. Nos últimos vinte anos, grandes transnacionais – principalmente as que atuam com transgênicos, agronegócio, medicamentos, conquistaram poder inédito. Nos Estados Unidos, por exemplo, elas são capazes de manter três lobistas para cada membro do Congresso”.

Boaventura não crê no chamado “capitalismo verde”. Ele apoia esforços como o de buscar fontes limpas de energia, mas pensa que serão vãos, caso as sociedades não evoluam para novas formas de produção e consumo. “E aqui – diz – as metrópoles terão um papel fundamental, porque é onde viverá, em breve, a maioria dos habitantes do planeta. O consumo responsável precisa ir além de guardar convenientemente o lixo. Ele precisa identificar os componentes dos produtos onde há sangue – meu celular, por exemplo, produzido com componentes extraídos dos territórios de antigas comunidades africanas. E pode empregar a força coletiva das metrópoles para distinguir o que não merece ser consumido ou produzido”.

A segunda ameaça relacionada a ataque a direitos sociais é a desvalorização do trabalho, ou empobrecimento generalizado dos povos. “Falamos do precariado (os trabalhadores que não têm direitos sociais) e do ciberiado (os que são obrigados a se manter todo o tempo ligados à internet, para produzir). O problema é que esta confusão entre tempo de trabalho e tempo livre s está produzindo dividendos para o capital. Trabalha-se no escritório, no ônibus, em casa. Os tempos livres, quando existem, estão todos colonizados pelo consumo. Passa-se o tempo em shopping centers – e depois, trabalhando novamente, para pagar as contas do consumismo…

“Em paralelo, há um regresso às formas de exploração que foram, no passado, caracterizadas como ‘acumulação primitiva’ de capital. Expulsam trabalhadores de suas terras. Eliminam-se direitos, como salários, subsídios, pensões. Isso é um terrorismo de Estado, promovido pelos Estados em tempos chamados de… ‘democráticos’!”.

A sétima ameaça é, para Boaventura, a comercialização do conhecimento. “Tenta-se fazer o que não se conseguiu até agora, que é destruir pensamento crítico. As Universidades – inclusive parte das que são públicas – valorizam o conhecimento segundo seu valor de mercado. Não se considera mais a curiosidade científica. Nos Estados Unidos, em certos departamentos de Biologia, há professores que só se promovem se ao seu lado houver uma empresa financiadora. Eu pergunto: qual o valor das humanidades, da poesia ou da literatura, neste sistema?”

Boaventura vê novos desafios para os movimentos que se articulam em torno do Fórum Social Mundial, nesta nova fase. “Estou em Porto Alegre para relançar, num conjunto de seminários, a Universidade Popular dos Movimentos Sociais. As oficinas que começamos a realizar mostram claramente que movimentos precisam se articular-se como nunca fizeram antes. Mulheres com operários, lésbicas com os que constroem a economia solidária, camponeses e pequenos empreendedores, muitas outras combinações. Se as ameaças estão bem articuladas, os movimentos também precisam preparar-se para isso.

Segundo o sociólogo português, três desafios podem inspirar estas articulações: os de democratizar, descolonizar, desmercantilizar.

Democratizar exige radicalidade”, diz ele. E explica: “Defino socialismo como sinônimo democracia sem fim, em todos os espaços. Não apenas nas instituições – mas no trabalho, em casa, na cama, Os partidos têm de entender que não têm o monopólio de representação política. Nem os movimentos, aliás, o têm. Estamos caminhando para um tempo de presenças. Presenças coletivas na rua, ocupando espaços que o capital reivindica, não ligadas necessariamente a um movimento instituído.

“Já no esforço por desmercantilizar a vida, as cidades têm papel enorme. É preciso retirar da esfera do comércio mercantil dimensões como as a cultura, a mobilidade urbana, as vivências, a sociabilidade. Os resultados são imediatos. Por exemplo: a cultura, que está sendo banalizada, ressurge imediatamente como espaço de resistência, quando tratada como um direito e uma inspiração humana”.

Ao abordar a descolonização, Boaventura – que apoia os governos de Dilma Rousseff na presidência do Brasil e do governador Tarso Genro, no estado do Rio Grande do Sul, lança-lhes algumas alfinetadas. “O Brasil, que tem criado tantos bons paradigmas, não pode estar ao lado do neoliberalismo, nem orgulhar-se do ‘novo’ Código Florestal, ou de abreviar os processos de licenciamento ambiental para apressar algumas grandes obras”.

O sociólogo confessa, ao final: “Sou um otimista trágico. Acredito nas mudanças do mundo, mas sei que elas custarão enorme esforço, mobilização, às vezes dores”. Ele faz previsões para os anos 2010: “sta década vai exigir líderes mais esclarecidos, mais imaginativos; e movimentos sociais mais aguerridos. A luta contra fascismo social faz-se nas instituições, mas também na defesa, nas ruas, de uma democracia sem fim.

A fala de Boaventura ocorreu no âmbito de uma das principais atividades do FST: um seminário organizado em Canoas, pela rede que organizada o Fórum de Autoridades Locais de Cidades de Periferia (FALP). Criada em 2006, no I FALP, realizado em Nanterre (periferia de Paris), esta articulação promoveu um segundo encontro em 2010, em Getafe (periferia de Madri). Prepara um III FALP em Canoas, em junho de 2013.. Será o primeiro no hemisfério Sul. Espera-se que reúna mais de mil autoridades, de 200 metrópoles do planeta. O seminário inaugurado dia 25 é preparatório para a atividade do próximo ano.

A conferência do sociólogo foi antecedida por exposições de autoridades gaúchas e brasileiras. O presidente da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, Adão Villaverde, destacou a importância de adotar, a partir das cidades de periferia, dinâmicas de democracia participativa. “Está em nosso poder criar estruturas de partilhamento. Não significa deixar de tomar decisões, de ser positivos. Mas temos várias experiências de participação real e podemos multiplicá-las”, frisou.

O prefeito de Nanterre, Patrick Jarry, saudou a disposição de Canoas, de sediar o III FALP Sustentáveis”. Sobre a valorização das periferias de metrópoles, destacou: “Não queremos ser os invisíveis de um planeta que está se tornando majoritariamente urbano. O olhar da periferia, seus desejos e escolhas não podem ser submetidos. Para que outro mundo seja possível, nossos territórios de periferia jogarão um papel essencial”.

Muito aplaudido por um público formado principalmente por habitantes de Canoas, o prefeito da cidade, Jairo Jorge, citou o escritor italiano Italo Calvino, para quem “não importam numa cidade suas 7 ou 77 maravilhas. Mas as respostas que dá a suas perguntas”. Frisou que “há novas perguntas, para novos problemas. As mudanças climáticas, por exemplo, não derrubam apenas as pedras das cidades. Elas tragam vidas, que estão na maioria das vezes na periferia das regiões metropolitanas”. Concluiu afirmando que “é preciso debater uma agenda que apresente voz da periferia. Ela significa propor um novo conceito: o metrópoles solidárias, democráticas, sustentáveis – e livres de preconceitos.

Uma Avenida em Meu Quintal

O documentário “Uma avenida em meu quintal” foi produzido pelo Programa de Extensão Pólos de Cidadania, da UFMG, e dirigido por Frederico Triani e Samira Motta. O filme aborda a experiência do morador do Aglomerado da Serra junto ao programa de urbanização e regularização fundiária de vilas e favelas Vila Viva, da cidade de Belo Horizonte.

Produção: Programa Pólos de Cidadania – UFMG
Direção: Frederico Triani e Samira Motta
Duração: 47′

DOWNLOAD:http://www.4shared.com/video/DEjBKGX6/Uma_Avenida_em_Meu_Quintal.html

Mais casas, mais especulação

Fonte: Brasil de Fato

Os números relativos ao déficit habitacional no Brasil variam. Depende da pesquisa, do ano realizado e das perguntas que foram feitas. Com base nos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2005, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em seu Comunicado 118, que trata do planejamento da habitação de interesse social, calcula o déficit em 7,9 milhões de moradias em todo o país, ou seja, o Brasil precisaria de mais 15% de domicílios para conseguir abrigar sua população. Foram esses dados a referência para o Plano Nacional de Habitação.

“Tudo indica que o déficit está abaixo desse valor, devido a mudanças de metodologia do cálculo e também por conta da política habitacional no período”, explica Cleandro Krause, técnico de planejamento e pesquisa, que participou da equipe de elaboração do comunicado. O estudo mais recente da Fundação João Pinheiro, em parceria com a Secretaria Nacional de Habitação do Ministério das Cidades e com o Banco Mundial, mostra que em 2008 a estimativa do déficit era de 5,546 milhões de moradias, 83% dessas na área urbana.

Para medir a necessidade de construção de novas moradias para atender à demanda habitacional – ou seja, para medir o déficit – entram na conta as habitações precárias, a coabitação familiar, o ônus excessivo com aluguel (mais de 30% da renda familiar). Uma das mudanças de metodologia foi incluir a coabitação consentida. Além desses casos de necessidade de novas moradias, há também o cálculo de “inadequação de domicílios”, que mede a carência de serviços urbanos de infraestrutura, como saneamento básico, energia elétrica e outros. É nesse quesito que entram os loteamentos irregulares, favelas e cortiços.

No estudo da Fundação João Pinheiro, um dado permanece praticamente inalterado: o déficit habitacional é concentrado na faixa salarial de até três salários mínimos e 89,6% das famílias sem moradia ganham, no máximo, três salários, ou seja, R$ 1635, de acordo com o mínimo atual.

Os pacotes governamentais para enfrentar essa situação não levam em consideração um dado apontado na pesquisa do Ipea: em valores absolutos, o estoque imobiliário corresponde ao déficit habitacional. Segundo o comunicado, em 2006 foram contabilizados 6,7 milhões de imóveis vazios. “São domicílios fechados, não são para uso eventual, como casa de veraneio ou em reformas.

Mas é importante destacar que não existe uma correspondência de 1 para 1 em cada município do Brasil”, aponta Cleandro. “Nesse momento a política habitacional ainda não consegue tratar em grande escala o uso dos domicílios fechados. O que já produziu algum resultados são os imóveis da União que já foram destinados para uso habitacional”, reforça.

Joviano Mayer, advogado da ocupação Dandara, em Belo Horizonte (MG) e militante das Brigadas Populares, destaca que esses imóveis deveriam ser desapropriados, conforme aponta não só o Estatuto da Cidade, mas a Constituição.

“Os imóveis urbanos devem cumprir sua função social e ao não cumprir devem ser desapropriados. O problema da habitação no Brasil não é um problema de falta de moradia, que requer novos empreendimentos. Se fosse cumprida a lei, a quantidade de imóveis ociosos retidos poderiam suprir o déficit habitacional”.

Minha casa?

O Programa Minha Casa, Minha Vida, lançado em 2009 como “o maior programa habitacional do país”, tinha a meta de construir um milhão de moradias. Em junho deste ano foi lançada versão 2, com a meta de dois milhões de moradias. Em parceria com a Caixa Econômica Federal e empresas privadas, o programa, de acordo com sua versão oficial, “nada mais é do que um conjunto de fi nanciamentos imobiliários destinados às famílias carentes do Brasil”. As famílias são divididas em três grupos: de 0 a três salários, de 3 a 6 e até dez salários mínimos. O programa entregou até agora 438.449 moradias no país e a previsão é entregar o restante do previsto para a primeira fase até o meio do ano que vem. A justificativa para o número abaixo do 1 milhão previsto é o ciclo do empreendimento, que costuma levar até 18 meses.

Mas a crítica principal dos movimentos sociais ao programa não é a demora ou a não realização dos gastos, e sim sua estrutura e prioridades. Maria das Graças Xavier, da União dos Movimentos de Moradia de São Paulo, acredita que o programa é o “melhor” para a aquisição da casa própria, com contrato de compra e venda, mas não consegue chegar ao público principal. “A maior parte do programa é voltada para rendas maiores de 4 salários e nós trabalhamos com a faixa de até 3 salários. Hoje os movimentos vão até uma região, fazem estudo do terreno e, até comprar, a Caixa demora a repassar e a imobiliária vem e compra o terreno antes do movimento, por um valor maior”, explica.

Segundo Maria das Graças, com o lançamento do programa a especulação imobiliária fez com que o custo da terra aumentasse cada vez mais. “O metro quadrado triplicou em São Paulo”, denuncia. “Em São Paulo, o programa não atingiu nem 10% da necessidade de moradias ainda”. Outro problema, de acordo com ela, é a falta de vontade política para garantir a implementação do programa por parte de prefeituras e governos estaduais, principalmente na região Sudeste.

“O programa ao invés de enfrentar a ação perversa da ação imobiliária, a alimenta”, avalia Joviano Mayer, que afirma que em Belo Horizonte nenhuma unidade sequer foi destinada às famílias de até três salários. “Não há um interesse em construir para esse perfil. Nas cidades em que há a construção pelo programa, ela é destinada à faixa mais alta, de até 10 salários. É mais vantajoso para as empresas construir empreendimentos de alto padrão”, pontua.

Outro ponto levantado pelos movimentos é falta de participação social no planejamento do programa. “O Minha Casa, Minha Vida desconsiderou o acúmulo do programa nacional de habitação de interesse social. Assim o governo abriu mão de outros programas que, ainda que com limitações, atendiam às demandas. O Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social (FNHIS), por exemplo, perdeu muito peso”, destaca Joviano.

Esse elemento também é colocado no comunicado do Ipea, que analisa os demais programas habitacionais e a constituição do FNHIS. “Se a gente olha para o Fundo, vê que os recursos para o Minha Casa, Minha Vida não passam por ele. É claro que o programa não é apenas uma política habitacional, é também um programa de recuperação da economia. Mas seus recursos não estão sujeitos ao controle social que o conselho gestor poderia fazer. O comitê de acompanhamento é formado só pelo governo”, afirma Cleandro. “A questão que a gente coloca é a seguinte: os recursos da União que vão para o Minha Casa, Minha Vida deveriam ser alocados seguindo critérios que os conselhos de habitação e interesse social possam definir. Existe uma expectativa da sociedade que o programa possa ter controle social. Temos instrumentos criados para isso”, explica.

Renda fundiária

A urbanista e professora da Faculdade de Arquitetura da USP Ermínia Maricato acrescenta: “entrar com recurso financeiro sem fazer a reforma fundiária faz com que aumente a especulação e a renda fundiária”. Ela explica que é impossível eliminar a renda fundiária no capitalismo, mas pode haver formas de atacá-la, ao invés de aumentá- la, como vem sendo feito. “Esse dinheiro que está entrando está indo para a renda da terra e reproduzindo a exclusão. A terra é um negócio, não tem nada a ver com inclusão social, com sustentabilidade, com harmonia no crescimento urbano, com eficiência. Tem a ver com o lucro”, afirma.

Ermínia, que participou da elaboração do Estatuto da Cidade, afirma que ele foi um importante marco institucional, mas não foi implementado. “Na medida em que a sustentação do estatuto deveria ser feita pelas forças sociais que lutaram pela reforma urbana, fundiária, imobiliária, isso não aconteceu. Ao contrário, há cidades em que o preço da terra chegou a dobrar”. Ermínia aponta a contradição: justamente quando a renda da terra no Brasil estava se valorizando, chegando a ser a maior valorização do mundo, o programa Minha Casa, Minha Vida foi lançado.

“Tem gente que acha que valorização imobiliária é progresso. Essas empresas, do mercado privado legal, produzem para menos de 50% do país. O resto o povo faz do jeito que dá pra fazer. É uma questão muito séria essa ignorância sobre o controle do uso e ocupação do solo. Aumentar o preço da terra, retendo imóveis vazios, transformar o mercado de imóveis num ativo financeiro não vai resolver jamais o problema urbano”, avalia.

Segundo Ermínia, o “nó da terra” se complica ainda mais pela influência das forças do capital imobiliário nas Câmaras Municipais, Assembleias Legislativas e no Congresso Nacional. “A plataforma da valorização imobiliária, a retenção da especulação é municipal, estadual do ponto de vista metropolitano, e nacional”, aponta.

Despejos

Além da demanda direta por moradias, os movimentos sociais chamam atenção para outro problema: os despejos. O Estatuto da Cidade prevê que todas as cidades com mais de 20 mil habitantes devem fazer seu Plano Diretor, uma lei municipal que realiza as diretrizes do estatuto. O Plano Diretor do Município de São Paulo, por exemplo, foi aprovado em 2002 e coloca a garantia da participação dos moradores nos projetos de urbanização que os afetam diretamente.

Delana Corazza, do Escritório Modelo Dom Paulo Evaristo Arns, da PUCSP, afirma que diversas remoções estão acontecendo sem que a população seja devidamente envolvida. “A população é despejada e depois há uma ampla divulgação por parte da Prefeitura sobre os projetos nas áreas onde ocorreram as remoções, no entanto, não se divulga que a população não foi sequer notificada para que participassem do debate sobre os projetos. Há comunidades que viviam em suas casas há mais de 30 anos, foram removidas, estão recebendo auxílio-aluguel e não fazem ideia de como será o futuro, se voltarão ao local, qual a previsão desse retorno”, aponta. “Muitas viviam em casas de alvenaria, famílias de 6, 7 pessoas, com previsão de aumentar as casas para as próximas gerações, e agora, com sorte, irão para os apartamentos subsidiados que não ultrapassam os 50 metros quadrados, sendo que nunca perguntaram para elas se era esse o futuro que tinham previsto ou planejado”, completa.

Justiça socioambiental: o direito à moradia e ao meio ambiente não podem ser conciliados?

O vídeo-documentário abaixo foi realizado pela estudante Caroline Pera, integrante do grupo de pesquisa “Água no Meio Urbano”, da PUC-Campinas, coordenado pela Profª Laura Bueno.

O vídeo retrata a realidade dos moradores do Beco Mokarzel, conhecido como Beco de Sousas, localizado no distrito de Sousas, em Campinas, São Paulo.

A pergunta lançada pelo filme é: Será que é preciso retirar os mais pobres da cidade para promover justiça ambiental?

Fonte: Blog da Raquel Rolnik

Torres Gêmeas: Governo e Prefeitura dizem que vão cumprir determinação; moradores querem mais tempo.

Começa a contar hoje o prazo de 48 horas estabelecido pela Justiça para que um dos prédios conhecidos como Torres Gêmeas, no bairro Santa Tereza, Leste de Belo Horizonte, seja desocupado. O Estado, que foi intimado a interditar o local, informou que irá definir, em reunião com representantes da Justiça e da prefeitura da capital, como será feita a retirada das famílias.

A decisão da desocupação é de 29 de agosto, mas só ontem, depois que O Tempo publicou a decisão da Justiça de desocupação dos prédios, o Fórum Lafayette recebeu as notificações assinadas pelo prefeito Marcio Lacerda e o governador Antonio Anastasia – a devolução era pré-requisito para a contagem do prazo.

Decisão. A decisão é liminar e estabelece que o Corpo de Bombeiros interdite o prédio e a prefeitura providencie um local seguro para alojamento dos moradores até que eles sejam incluídos no programa de bolsa-aluguel.

O procurador-geral do município, Marco Antônio Teixeira, afirmou que a prefeitura vai cumprir a decisão judicial. Porém, a Companhia Urbanizadora de Belo Horizonte (Urbel) informou que ainda não foi notificada e não soube dizer se haverá abrigo para as 85 famílias que vivem no edifício.

A promotora Marta Alves Larcher, uma das autoras da ação civil pública que deu resultou na liminar, disse que o objetivo da desocupação é garantir a segurança das famílias que lá vivem. “Não vamos mais aceitar desculpas do Executivo. Assim como o outro, esse prédio, que ainda está ocupado, corre risco de pegar fogo. Não podemos esperar que aconteça outro desastre. O Estado e o município já tiveram muito tempo para discutir, agora devem cumprir a liminar”, disse a promotora.

Os moradores foram ontem à Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa pedir a ajuda dos deputados. Eles pedem que o prazo para desocupação seja estendido.

Fonte: O Tempo

Diálogos – Uma ideia para Belo Horizonte

Atualização da publicação de 17/06/2011

A autoconstrução na RMBH

Depoimentos sobre as condições de produção, os processos produtivos e os saberes relacionados à autoconstrução na Região Metropolitana de Belo Horizonte.

Entrevistas realizadas pelo Grupo de Pesquisa Praxis com autoconstrutores da Região Norte de Belo Horizonte, da Comunidade Irmã Dorothy e do bairro Jardim Canadá (Nova Lima).

MPF investiga se obras para a Copa 2014 irão respeitar o direito à moradia

Obras viárias irão desalojar mais de 500 famílias de bairro pobre da periferia de Belo Horizonte

Além de investigar eventuais irregularidades no projeto em que se baseia a licitação para as obras de ampliação do Anel Rodoviário de Belo Horizonte, o Ministério Público Federal (MPF) também apura se os projetos para a Copa 2014 estão respeitando os direitos humanos, em especial os relativos à moradia. 

Em abril deste ano, a Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão (PRDC) converteu em Inquérito Civil Público um procedimento administrativo instaurado, inicialmente, para investigar a situação dos moradores da comunidade Vila da Luz, que residem no entroncamento entre as BRs 381 e 262, perto dos bairros Jardim Vitória e Goiânia, na região nordeste da capital mineira. São mais de 500 famílias instaladas no local, algumas desde 1984, em precária situação de existência, sem qualquer infraestrutura urbana. As moradias precárias ocupam terrenos públicos, em área de domínio da União situada às margens de rodovia federal.

Para o MPF, “a ocupação irregular é subproduto da omissão do Estado no seu dever de promover políticas públicas que garantam a regularização fundiária e a inclusão social das pessoas menos favorecidas”.

Desde o ano passado, o Departamento Nacional de Infraestrutura Terrestre (DNIT) tem notificado os moradores para que deixem o local. Sem ter para onde ir, e com o absoluto descaso dos órgãos públicos, as famílias resistem no local.

Segundo a PRDC, o problema repete-se em outros bairros e vilas de Belo Horizonte. No total, mais de 2000 famílias de baixa renda estão sob a ameaça de serem desalojadas com a realização das obras para a Copa.

A notícia de que o projeto de ampliação do Anel Rodoviário está viciado por um superfaturamento de mais de 300 milhões de reais indignou a procuradora regional dos Direitos do Cidadão, Silmara Goulart. “É absurda a notícia de que o Poder Público está com dinheiro sobrando para gastar em obras de infraestrutura, enquanto, por outro lado, não destinou absolutamente nenhuma verba para a realocação das milhares de pessoas carentes que residem no local”.

A PRDC lembra que o Brasil é signatário de tratados e acordos internacionais que obrigam o Estado, em seus diferentes níveis – União, estados e municípios -, a garantir o respeito aos direitos humanos, e, por meio da execução de políticas públicas habitacionais, garantir a todos o direito à moradia digna e bem localizada.

“Ou seja, pessoas que têm suas moradias, ainda que precárias, não podem ser expulsas sem a garantia de novos locais onde possam se instalar. É inadmissível que, nas verbas públicas destinadas à Copa 2014, não estejam incluídos projetos destinados a diminuir os impactos sociais negativos dos empreendimentos, especialmente sobre a população mais vulnerável”, afirma Silmara Goulart.

Fonte: Ministério Público Federal – Procuradoria da República em Minas Gerais

Minas Gerais e RMBH no Censo 2010: envelhecimento e diferenças regionais

Os dados divulgados até o momento pelo Censo 2010 apontam que o estado de Minas Gerais segue a tendência das demais regiões do país, com envelhecimento populacional e expressivo aumento na participação dos adultos na fase produtiva (20 a 60 anos). No entanto, o estado mineiro e a RM de Belo Horizonte apresentam diferenças regionais fortes, sobretudo por conta da oposição entre centro e periferia.

Análise preliminar dos pesquisadores Jupira Mendonça, professora Associada da Escola de Arquitetura (UFMG), e André Junqueira Caetano, professor adjunto da PUC Minas – integrantes do núcleo local da rede Observatório das Metrópoles, mostra que em todas as mesorregiões de Minas Gerais se verificou o envelhecimento da população na última década, em especial da população feminina.

No entanto, as regiões mais pobres do estado apresentaram maior percentual de crianças e adolescentes no conjunto de sua população, com destaque para as mesorregiões Jequitinhonha, Norte de Minas e Vale do Mucuri. Observou-se também nessas regiões mais pobres (incluindo a mesorregião do Noroeste de Minas) a menor idade média.

Em relação à região metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), além do fenômeno do envelhecimento, houve expressivo aumento na participação dos adultos na fase produtiva (20 a 60 anos). Na RMBH também se verificou desigualdades no que diz respeito à idade média da população, sendo maior na capital do que nos demais municípios.

 

Crescimento e distribuição da população

Os municípios que mais cresceram em Minas Gerais são aqueles de porte médio e grande, à exceção da capital (ver Tab.1) – os 29 municípios com população entre 100 mil e 1 milhão de habitantes receberam 91% de todo o incremento populacional do estado  na década de 2000. Os municípios com menos de 10 mil habitantes, ao contrário, perderam população na última década.

Minas Gerais – Crescimento populacional por classe de município


Em termos regionais, a população continuou concentrando-se na Mesorregião Metropolitana de Belo Horizonte, como pode ser observado no gráfico abaixo. A distribuição mesorregional não se alterou muito na década, destacando-se ligeiro ganho na participação do Triângulo/Alto Paranaíba e do Oeste de Minas e ligeira queda na participação das mesorregiões Vale do Rio Doce e Zona da Mata.

 

Belo Horizonte vem perdendo população para os municípios da sua periferia, destacando-se os municípios a norte e oeste. Considerando o território que constituía a RMBH em 1991, a capital passa de 75% da população da RM, em 1970, para 50% em 2010. Assim como na grande maioria das regiões metropolitanas brasileiras, o movimento demográfico nas décadas de 1950 a 1970 era constituído de fluxos migratórios de longa distância, vindos para as capitais e grandes cidades. A partir dos anos oitenta, à diminuição dos fluxos de longa distância corresponde o movimento do centro para as periferias.

 

Acesse o relatório completo sobre Minas Gerais e a RMBH aqui.

 

Fonte: Observatório das Metrópoles